O
PPGMUSEU, O MUSEU AFRO E A ABERTURA À INTERCULTURALIDADE
Em 2014, participei da seleção para Pesquisador/Docente com Bolsa do Programa Nacional de Pós-Doutorado (PNPD) do Programa de Pós-Graduação em Museologia do Departamento de Museologia da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Federal da Bahia (UFBA). Apresentei o projeto de pesquisa intitulado “Áreas de Culturas Negras ao Sul do Atlântico - De uma história eurocêntrica a perspectivas post-coloniais”, com foco em expressividades, linguagens, celebrações, performances, práticas e heranças de grupos afrodescendentes, sobretudo rurais, tema a que me dedico já há alguns anos.
Em meio ao entusiasmo pela aprovação e à
expectativa de viver a/na Bahia, particularmente Salvador, advieram as dúvidas:
como minha pesquisa poderia se enriquecer no âmbito de um Departamento de
Museologia, incorporada a uma linha de pesquisa em Museologia e Desenvolvimento
Social? O que eu, vinda de graduação em Comunicação Social/Jornalismo, com
especialização em História da África, e Mestrado e Doutorado em História
Social, ambos com foco na diáspora africana, teria a oferecer ao programa, uma
vez que havia a obrigatoriedade de atividades de docência? Ao fim, o sentido do
desafio foi mais forte.
A perspectiva inter e transdisciplinar,
alicerçada nos Estudos Culturais e em vertentes dos estudos pós-coloniais,
perpassam minha trajetória acadêmica pois, como pontua o filósofo e teórico
argentino Enrique Dussel (1966), desconstruir o pensamento imperial, ou a
colonialidade do saber, isto é, a perspectiva eurocêntrica como única forma
válida de conhecimento, requer “uma pedagogia crítica e fortemente ancorada na
‘interculturalidade’, de forma a permitir a emergência de outros paradigmas e a
restituição do direito à enunciação epistêmica” (DUSSEL, 1996).
O desejo de ampliar conhecimentos e redes
de troca, estabelecendo novas interlocuções teóricas, me levou a encarar um
campo do saber praticamente desconhecido para mim. O Programa de Pós-Graduação
em Museologia representava, então, a chance de entrar em contato com diferentes abordagens, autores,
concepções e percepções, sobretudo acerca da cultura afro-brasileira,
principalmente considerando um passado dos museus de consolidação de “discursos
e sinais sobre a presença negra carregados de lugares comuns, conceitos e
preconceitos” (CUNHA, 2006), em contraponto a reflexões do presente que buscam
rever formas de representação culturais de grupos não hegemônicos
Ao longo do estágio pós-doutoral a
pesquisas sofreu ajustes, passando a focar em práticas e expressividades de
grupos subalternizados nas “festas de largo” de Salvador e região do Recôncavo,
com vistas a apreender significados políticos e transgressões utilizados como
afirmação de suas identidades, em confronto à opressão e dominação racial e em
oposição a dispositivos de exclusão social. Além de acompanhar festas e
celebrações, levantei bibliografia sobre o tema, me inteirei sobre a amplitude
do campo museal, visitei candomblés e fiz uma espécie de etnografia pela vida e
espaços baianos. As diferentes vivências possibilitadas pelo estágio foram
fundamentais para ampliar meu escopo de conhecimentos.
Assim,
saúdo com muita alegria a chegada da Revista do Mafro- Africanidades, que nasce
com espírito e sentido intercultural, abrindo-se a colaboradores e
pesquisadores de diferentes campos do conhecimento, propondo-se a ser canal de
difusão dos plurais universos africanos e afro-diaspóricos.
[1] Doutora em História Social pela
PUC-SP. Cumpriu estágio Pós-Doutoral no PPGMuseu entre dezembro de 2014 e
setembro de 2016 com bolsa PNPD-CAPES. Atualmente integra Projeto de Mapeamento
das Comunidades Tradicionais de Matriz Bantu na Região Metropolitana de São
Paulo, coordenado pelo Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros da Universidade
Federal de São Paulo (NEAB/UNIFESP).
Nenhum comentário:
Postar um comentário